quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

O FIM DA TRÉGUA

NOVA IORQUE – Edifício Maddox - 17:29

- Até quando vamos ficar olhando pra esse prédio? – perguntou Natália.

- Ele ainda não chegou. – respondeu Du.

- Mas faz três dias que estamos aqui. Já pensou que o Pedro pode estar morto?

- Maddox está aí, esperando o “pacote”.

- Durante a noite você fica vigiando-o, mas, agora, você não pode fazer nada.

- Eu não posso fazer tudo, mas não quer dizer que não posso fazer nada. Quando ele chegar, eu saberei.

- E o quê faremos?

- Eu vou entrar pela porta da frente, você vai fazer compras.

- Não vou te deixar sozinho nessa.

- E vai fazer o que? Dar bolsadas no anjo?

- Você pode me arrumar uma arma.

- Eu posso te deixar no inferno também, quer?

- Ignorante.

- Olha, como não sei onde estaria segura te trouxe comigo, mas você só vai aqui.

- E se der errado?

- Aí você terá que se virar pra voltar pro Brasil.

- Deixa seus cartões de crédito comigo então.

- Nem pensar. Apesar das probabilidades, não quero morrer hoje.

- Pela primeira vez você está sério, concentrado...

- Acho que tenho motivos, não? Sabe o que é engraçado nisso tudo? Há quase 15 anos, Pedro pulou da cobertura desse mesmo prédio por que não queria matar a pessoa que hoje está com a arma na cabeça dele.

- Por isso que eu digo “nunca perca a chance de matar alguém”.

- Ta vendo aquela van entrando no estacionamento? É ele.

- Tem certeza?

- Dessa vez sim.

- Boa sorte. Estarei esperando no hotel.

- Pede uma pizza pra mim.

Du entrou no Edifício Maddox, um prédio comercial onde, nos últimos três andares, é a residência de Sebastian Maddox, herdeiro de Maurice. Sentou-se num dos sofás do hall de entrada, e pegou uma revista, como se estivesse esperando alguém. Aguardou alguns minutos, tempo que achou necessário para que a van fosse descarregada. Atravessou o hall, entrou no primeiro elevador que encontrou e apertou o número 35. Não precisou digitar senha, o que não lhe causou estranheza, pois, perto do que esperava para aquele dia, isso era apenas mais um detalhe. O elevador chegou ao andar desejado e a porta se abriu. Caminhou até uma porta dupla, abriu-a sem pensar duas vezes. Deparou-se com quatro asiáticos fortes e armados, um jovem, loiro de olhos verdes e um homem que não conhecera pessoalmente, mas viu enquanto pesquisava o paradeiro de Pedro: Giovane Santana.

- Pensamos que tivesse fugido, Du. – disse Santana.

- E por quê pensaram isso? – perguntou Du.

- Ora, qualquer pessoa com um mínimo de juízo faria isso. Vá embora, ainda dá tempo.

- Onde está Pedro?

- No andar de cima. Gostaria de se despedir?

- Me acompanharia?

- Claro. – disse Santana sorrindo.

Seguiram até o que parecia ser um grande escritório, onde havia uma escada para o andar superior. Du foi na frente, seguido por Santana, o jovem loiro e os asiáticos. No 36º andar, Du viu Pedro, cheio de cortes pelo corpo, preso à parede pelo que pareciam grandes pregos de metal, que atravessavam seus tornozelos, joelhos, cotovelos e pulsos. Uma lança estava cravada no lado direito do peito de Pedro. Em frente a Pedro, estava um homem, que aparentava ter uns quarenta e poucos anos, segurando uma faca. Apesar do tempo, Du reconheceu o homem como sendo Sebastian Maddox.

- Pensei que não viesse mais. – disse Pedro.

- Que visão do inferno! Poderiam ao menos ter te colocado umas roupas. – disse Du.

- E aí, já almoçou? – perguntou Pedro.

- Comi um lanche agora a pouco. Tu vai ficar nessa até que hora?

- Sei lá. Pergunta pro anfitrião.

- Sebastian Maddox? – disse Du - Quanto tempo! Não tinha te reconhecido, rapaz! Tu não se lembra de mim porque nunca fomos apresentados.

- Sem palhaçadas. – disse Maddox olhando friamente para Du – Vá embora.

- Arrogante ele, não? – disse Du a Pedro.

- E como. Ele ta achando que os quatro “china” dele são suficientes. – respondeu Pedro.

- Cara, chinês só luta bem em filme. – disse Du – A vantagem é que, como tudo que vem da China, eles são baratos, mas a qualidade é bem inferior. Pelo preço de um ex-militar russo você contrata quantos chineses?

- Senhor, eu posso dar um jeito nesse verme. – disse o jovem loiro a Maddox.

- E de onde tiraram essa figura? – perguntou Du rindo enquanto analisava o jovem – Cara, tu é estilista ou assassino?

- Ele é Eniael, o anjo que você deve ter ouvido falar. – disse Pedro.

- Mostra tua verdadeira forma então porque to louco pra fazer uma canja. – disse Du ao anjo.

- Não quero bagunça na minha casa. – disse Maddox a Eniael – Leve-o até a garagem. Evite problemas no caminho, mas, se ele oferecer resistência, mate-o antes.

Dois chineses se posicionaram de cada lado de Du e Eniael seguiu-os a alguns passos atrás. Desceram as escadas que levam ao 35º andar. Ao passarem pela porta dupla, antes de entrarem no elevador, Du olhou para o anjo que o seguia e depois para o guarda-costas mais próximo do seu lado direito. Du acertou uma cotovelada no nariz do guarda-costas e tentou pegar sua arma, mas foi detido por Eniael, que segurou seu punho direito. Du acertou vários socos no rosto do anjo, mas era como bater em uma parede. Com a mão direta presa e a esquerda quebrada, Du não conseguiu evitar o ataque dos chineses. Deitado no chão, ainda com a mão segurada pelo anjo, sentiu suas costelas partirem e engoliu alguns dentes antes de ter o maxilar quebrado. Eniael pisou nas costas de Du, torceu seu braço direto e começou a puxá-lo até que se deslocou e, por fim, separou-se do resto do corpo. Como não conseguia gritar, Du urrava e se debatia.

Eniael apoiou o joelho direito sobre o ombro direito de Du, segurou a cabeça do demônio e começou a pulá-la. Du segurou o braço esquerdo do anjo e pronunciou algo indecifrável. Eniael desapareceu. As paredes da ante-sala se cobriram de sombras. Fios de arame farpado se enrolaram nos guarda-costas, que foram puxado para o centro do cômodo, presos de costas um para o outro. Du se levantou, segurando com a mão esquerda a mandíbula que estava sendo regenerada. Rasgou a garganta de um dos chineses e começou a tomar seu sangue. Sombras surgiram onde no seu ombro direito e foram tomando o formato de seu braço. Regenerado o braço direito, mordeu o pescoço de outro guarda-costas, sugando seu sangue mais rapidamente que o primeiro. Repetiu o processo no terceiro guarda-costas. Não podia perder tempo, pois sabia que o anjo logo estaria de volta. Antes de tomar o sangue do último guarda-costas, uma forte luz branca surgiu no teto da sala, de onde saiu Eniael.

- Pensou que podia me prender no inferno? – perguntou o anjo – Eu posso entrar e sair de lá quantas vezes quiser.

- Sei muito bem disso. – respondeu Du largando o terceiro guarda-costas – Só que você não se atentou a um detalhe.

- E qual seria?

- Meus poderes estão aumentando e os seus diminuindo, o que significa que já anoiteceu.

- Mas eu ainda tenho forças para acabar com você.

- Te mandei pro inferno para ter tempo de me regenerar. Além disso, você gastou seus poderes para sair de lá.

Eniael, com um soco, cravou sua mão direita no estômago do demônio, que contra atacou-o rapidamente, quebrando o braço do anjo.

- Minha vez. – disse Du sorrindo ao anjo.

No 36º andar, Pedro era fatiado por Maddox. Sem se incomodar com os gritos de Pedro, o milionário arrancava pedaços do vampiro e, sem dizer qualquer palavra, continuava a tortura, que incluía a utilização de ácidos nos ferimentos. Maddox sabia que não importava quanto o castigasse, Pedro não morreria. Sentia prazer no que estava fazendo e planejava fazê-lo por anos.

- Você não acredita em mim, não é? – disse Pedro – Não importa a verdade, mas sim o que te agrada.

- O que me agrada? – disse Maddox enquanto pegava uma faca de serra – Você e aquela vadia roubaram meu pai e depois o mataram.

- Anastácia? Eu a conheci no dia que fui embora! Nem sabia que ela e seu pai tinham um caso!

- Passei quase uma década brincando com ela como estou com você. Tem noção do que é passar por algo assim todas as noites?

- E o que aconteceu com ela?

- Ela implorava para morrer e eu disse que a mataria se ligasse para você falando do trabalho. Estava tão fraca que queimou instantaneamente ao ver o Sol.

- Por que você tem a proteção de um anjo?

- Eniael é apenas um dos que me apóiam.

- Apóiam no que? Você me queria, então acabou!

- Acha mesmo que isso termina aqui? Você e Du são apenas os primeiros. Logo extinguiremos todos, sem exceção.

- Se isso significa que só matará algum demônio depois de me matar, então acho que tu não vai matar ninguém. – disse Du saindo da escada de acesso, arrastando o anjo pelo tornozelo esquerdo.

Eniael teve a asa direta decepada e a esquerda, assim como suas pernas e braços, estava quebrada em várias partes.

Du estendeu a mão esquerda em direção a Pedro e os objetos que atravessavam seu corpo foram arrancados. Maddox segurou firmemente a faca que estava em suas mãos, mas sabia que não era capaz de enfrentar o demônio. Du arrastou o anjo até Pedro.

- Acho que você ta precisando de um lanchinho. – disse Du segurando o anjo pelos cabelos – Esse ta há muito tempo na terra, corrompido demais, mas ainda serve pra forrar o bucho.

Pedro mordeu o pescoço de Eniael e sugou seu sangue até que o corpo do anjo começou a se transformar em cinzas. Levantou-se, regenerou as feridas e voltou-se para Maddox.

- Seu avô me ajudou quando vim da Inglaterra. – disse Pedro – Ele nunca me julgou ou se importou com o fato de eu ser um vampiro, a única coisa ele que me pediu era que protegesse seu pai e, posteriormente, você. Esse é único motivo para eu te deixar vivo. Jamais se esqueça de uma coisa: nossa trégua termina aqui. Se você me procurar ou se eu suspeitar que está preparando algo pra mim, voltarei a essa cidade e matarei todos seus descendentes antes de pegá-lo.

- Os anjos acabarão com você. – disse Maddox – Acha que pode fazer o que fez e sair impune?

- Eles sempre estiveram atrás de mim, mas essa não é a questão. – respondeu Pedro - Se continuar se envolvendo com eles, bem, você já sabe como terminará. Adeus Maddox.

Sombras cobriram Du e Pedro e eles desapareceram. Maddox caminhou até a janela, apertou um botão no controle remoto que a abriu. Ficou observando a cidade, pensando que, talvez, Pedro não tivesse mesmo matado seu pai. Não sabia se estava pensando isso por ser verdade ou porque estava com medo da ameaça do vampiro. Apoiou as mãos na janela, abaixou a cabeça e começou a chorar. Sentiu, então, uma mão tocar seu ombro direito. Olhou para o lado direito e tremeu ao ver um anjo que emanava uma forte luz branca, muito mais poderoso que Eniael.

- Te avisei para não colocar sua vingança em primeiro plano. – disse o anjo – As ordens eram claras, você devia matar o vampiro.

- Desculpe, senhor, eu falhei. – disse Maddox – Não acontecerá novamente.

- Certamente não acontecerá. – disse o anjo arremessando Maddox pela janela.

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